Manchetes Socioambientais
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“O encontro entre índios e brancos só se pode fazer nos termos de uma necessária aliança entre parceiros igualmente diferentes, de modo a podermos, juntos, deslocar o desequilíbrio perpétuo do mundo um pouco mais para frente, adiando assim o seu fim.”
Eduardo Viveiros de Castro, antropólogo, um dos fundadores do ISA
O tema "Povos Indígenas" está na origem da existência do Instituto Socioambiental. Lá se vão pelo menos quatro décadas de comprometimento e trabalho com o tema, produzindo informações para a sociedade brasileira conhecer melhor seus povos originários. Desde sua fundação, em 1994, o ISA dá continuidade ao trabalho do Centro Ecumênico de Documentação e Informação (Cedi), que havia sido iniciado em 1980 e que, por sua vez, remonta ao começo dos anos 1970, quando o então governo da ditadura militar lançava o Plano de Integração Nacional, com forte componente de obras de infraestrutura na Amazônia, região que era então descrita pelo discurso oficial como um "vazio demográfico".
Por meio dos relatos coletados, dados produzidos e pesquisas empreendidas por uma rede de colaboradores espalhada pelas diversas regiões do País, o Cedi ajudou a derrubar essa tese. Ao dar publicidade às informações levantadas por essa rede social do tempo do telex, o Cedi colocou, definitivamente, os povos indígenas e suas terras no mapa do Brasil. Seus integrantes ainda participaram ativamente no movimento de inclusão dos direitos indígenas na Constituição de 1988 e, juntamente com integrantes do Núcleo de Direitos Indígenas (NDI) e ativistas ambientais, fundaram o ISA em 1994.
De lá para cá, ampliando sua rede de colaboradores em todo o País, o ISA se consolidou como referência nacional e internacional na produção, análise e difusão de informações qualificadas sobre os povos indígenas no Brasil. O site "Povos Indígenas no Brasil", lançado em 1997, é a maior enciclopédia publicada sobre as etnias indígenas no Brasil, com suas línguas, modos de vida, expressões artísticas etc. O site é uma das principais referências sobre o tema para pesquisadores, jornalistas, estudantes e acadêmicos.
A atuação hoje é transversal aos territórios onde atuamos, especialmente na Bacia do Xingu, no Mato Grosso e Pará, e Bacia do Rio Negro, no Amazonas e Roraima, e também envolve povos indígenas de todo o Brasil, por meio da atualização permanente do site e de seus mais de 200 verbetes, inclusão de novos textos sobre etnias emergentes e indígenas recém-contatados, além do monitoramento e cobertura jornalística sobre situações de violência e perda de direitos contra estas populações. O tema "Povos Indígenas" ainda é tratado no site "PIB Mirim", voltado ao público infanto juvenil e de educadores.
O monitoramento de Terras Indígenas também é um eixo central do nosso trabalho com o tema, e remonta à sistematização de dados e divulgação de informações iniciada pelo Cedi em 1986, e se dá por meio da produção de livros impressos e mapas temáticos sobre pressões e ameaças, como desmatamento, mineração, garimpo, obras de infraestrutura, entre outras, além do site "Terras Indígenas no Brasil".
Confira os conteúdos produzidos sobre este tema:
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Em formato de enciclopédia, é considerado a principal referência sobre o tema no país e no mundo |
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A mais completa fonte de informações sobre o tema no país |
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Site especial voltado ao público infanto-juvenil e de educadores |
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Painel de indicadores de consolidação territorial para as Terras Indígenas |
Um desejo de longa data da liderança histórica do povo Kayapó, obra é uma realização do Instituto Raoni e da Companhia das Letras, com apoio do ISA e do ISPN
O Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) recebe no dia 09 de setembro, às 19 horas, o evento de lançamento do livro Raoni-Memórias do Cacique. A obra concretiza um desejo de longa data do Cacique Raoni, e é uma realização do Instituto Raoni em parceria com a Companhia das Letras, com apoio do Instituto Socioambiental (ISA) e do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN). O evento será aberto ao público, haverá sessão de autógrafo com o cacique e um diálogo com Raoni, seu neto Beptuk Metuktire e Fernando Niemeyer.
Ropni, aportuguesado como Raoni, pertence ao povo Mẽbêngôkre, também conhecido como Kayapó Cacique, pajé e cuidador de seu povo, tornou-se uma liderança que conheceu o mundo dos brancos, fez alianças pessoais e políticas, dentro e fora do Brasil, e formou uma visão de mundo própria, onde não há diferença entre mito e história, revelando a complexidade do pensamento originário.
O livro foi construído a partir de entrevistas inéditas realizadas pelos tabdjwy de Raoni, seus netos, entre 2020 e 2023. Falando sempre em mẽbêngôkre, e rodeado de parentes, Raoni gravou durante dezenas de horas, em diversas sessões, as histórias e mitos que resultaram neste relato. O material foi traduzido para o português por meio de um trabalho meticuloso e extenso de uma equipe de tradutores Mêbêngôkre, sob a coordenação do antropólogo Fernando Niemeyer, que também supervisionou a redação e edição do manuscrito.
As memórias do cacique nos convidam a enxergar a história do Brasil pela perspectiva daqueles que sempre habitaram estas terras, que testemunharam a chegada dos invasores e que, desde então, elaboram estratégias de resistência. É a perspectiva daqueles que veem a floresta viva e repleta de espíritos como seu principal meio de existência e que lutam por ela como um ato de esperança para o futuro.
"Me comovo quando penso em Raoni, herói mítico do panteão dos guerreiros, líder da resistência nativa no continente americano com quem temos a oportunidade de conviver, alguém de cuja luta podemos ser testemunhas", compartilha Ailton Krenak.
Raoni nasceu em 1937, na região do Kapôt, norte do Mato Grosso, e tornou-se intermediário entre seu povo e os não indígenas em viagens dentro e fora do Brasil para reivindicar seus interesses coletivos e buscar alianças e recursos. Com atuação emblemática na arena política, teve importância decisiva na demarcação de vários territórios e na conquista de direitos indígenas a partir da década de 1970.
Serviço
Memórias do Cacique: Um diálogo com Raoni Mẽtyktire, Beptuk Metuktire e Fernando Niemeyer
Mediação: Danna Dantas
Local: Centro Cultural Banco do Brasil de Brasília (SCES, Trecho 2 - Asa Sul, Brasília/DF), aberto de terça a domingo, das 9h às 21h
Data: 09 de setembro, às 19h
Ingressos: bb.com.br/cultura ou na bilheteria do CCBB Brasília a partir do dia 8/9, às 12h (via link ou na bilheteria física)
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Relato de intercâmbio entre Ehuana Yanomami e 16 mulheres-liderança do povo Guarani revela laços entre as lutas de mulheres indígenas na defesa de seus territórios
“Elas são como nós, Yanomami”. Essa foi uma das conclusões a que chegou a liderança Ehuana Yaira Yanomami, após percorrer os cerca de 3500 km que separam a aldeia Demini, na Terra Indígena (TI) Yanomami, em Roraima, da aldeia Kalipety, na TI Tenondé Porã, na capital paulista.
Recebida por um grupo de dezesseis mulheres do povo Guarani, que participam do conselho de lideranças de seu território, Ehuana deixou a aldeia com a certeza de que as mulheres guarani são verdadeiras defensoras da floresta e que seus saberes, sua língua e sua cultura estão vivas – mesmo morando tão perto da cidade, onde predomina o modo de vida dos não indígenas, chamados de napë pë em yanomami, juruá em guarani. "Apesar de estar na cidade de São Paulo, cheguei no lugar onde eles fizeram uma floresta", celebrou Ehuana.
Ela, além de liderança, é pesquisadora e artista plástica. Sua ida a São Paulo aconteceu em razão de uma série de palestras que daria em um colégio na cidade, mas a visita à TI Tenondé Porã nasceu do desejo de Ehuana conhecer e dialogar com outras mulheres indígenas em posição de liderança como ela. A demanda foi recebida por Jera Poty Mirim, liderança da tekoa Kalipety, que se prontificou a recebê-la em seu território.
Em comum, elas tinham não só o fato de serem mulheres e lideranças de seus povos, mas também de serem protagonistas do movimento de mulheres indígenas, responsáveis por articular encontros de mulheres em suas terras. Os Encontros de Mulheres Yanomami e as Kunhangue Nhemboaty, assembleias de mulheres guarani, foram destaque na publicação Povos Indígenas no Brasil 2017-2022.
No artigo que publicou com outras mulheres de seu povo no livro, Jera fala da importância das mulheres ocuparem posições de liderança em suas comunidades e territórios: “Quando era criança, tinha constantemente reuniões gerais, nhemboaty guaxu como diziam, e sempre, sempre, eram só homens falando. Acredito muito que a participação das mulheres no trabalho político interno, só vai fortalecer. Não exterminar os homens ou mandar todo mundo pra cadeia, ou coisa do tipo. Vai fortalecer o nhandereko de novo, o nosso modo de ser guarani”.
Hoje, Jera é uma das vozes do conselho de lideranças da TI Tenondé Porã e ajuda a fortalecer outras mulheres guarani para que ocupem posições de liderança em diversos âmbitos da vida no território, como donas de roças, mestras de cantos-rezas, educadoras, artesãs, comunicadoras, motoristas, entre outras.
Para esse intercâmbio cultural e político, ela reuniu outras 16 mulheres-lideranças, representando aldeias como Tape Porã, Yporã, Tape Mirim, Kalipety e Krukutu. A atividade foi articulada pela organização indígena Comitê Interaldeias em parceria com o Instituto Socioambiental (ISA) e contou com o apoio da Hutukara Associação Yanomami (HAY).
“Essa foi a primeira vez que eu conheci os Guarani, foi a primeira vez que eu fui em outra Terra Indígena. Até então eu só tinha conhecido a cidade dos napë. Então eu cheguei até a Terra onde mora Jera Guarani, a liderança que nos recebeu, e quando cheguei até ali, eu ouvi sobre o sofrimento do povo Guarani. Os näpe há 500 anos destroem seu território, seu povo, mas eles fazem a retomada”, constatou Ehuana.
Geovana dos Santos Lima, jovem indígena, estudante de ciências sociais e pesquisadora do Instituto Socioambiental (ISA), é quem narra os trechos a seguir. Ela acompanhou o encontro junto a Tatiane Klein, antropóloga e jornalista no ISA, e Ana Maria Machado, antropóloga indigenista e tradutora do encontro.
Uma ponte entre mundos
por Geovana Lima
A estrada de barro balançava o carro e, com ele, os corpos e as expectativas. Pelas janelas, víamos a mata se adensar, como quem se aproxima de algo vivo, palpitante. A chegada à aldeia Kalipety foi anunciada por placas, cheiros, sons e acolhimentos.
“Apesar de eu estar bem longe da minha terra, cheguei até a terra deles”, observou Ehuana Yanomami.
Ela examinou as roças de batata-doce, mandioca, urucum e a forma como o povo Guarani trabalha, como preparam seus alimentos e como fizeram renascer a mata. "Os napë pë destruíram muito a floresta deles, mas eles replantaram. Hoje, apesar de cercados pela cidade, eles resistem e permanecem em sua terra", contou.
Um café da manhã nos esperava, repleto de xipa (uma espécie de pão frito), batata-doce cozida, mbeju e rora (um tipo de cuscuz) — e da presença animada do cachorrinho Pipoca, que circulava entre as pessoas como um anfitrião atento. O xipa, em especial, nos conquistou.
Logo após o café, fomos caminhar pelo território, onde vimos diversos plantios e roças cuidadas com zelo. “Eu fui até a roça, onde eles plantam batatas doces, macaxeiras, pés de urucum, eu vi essa árvore. E vi também a forma como eles fazem para manter a terra sempre úmida“, detalhou Ehuana, se referindo à cobertura de folhas feita pelos Guarani em seus roçados, para manter a umidade da terra.
A entrada nesse espaço revelou algo fundamental: naquele momento, eram apenas mulheres ali. Cantando, rezando, servindo-se, trocando saberes, compartilhando alimentos, comentando suas trajetórias. Uma cena de força e de escuta, onde a espiritualidade e a política se entrelaçavam com naturalidade.
Em círculo, nos apresentamos. Cada mulher compartilhou sua realidade, desafios e formas de luta. Ehuana contou da emoção ao receber o convite para conhecer o território guarani; disse que seu peito se encheu de alegria. Aline Jaxuka, uma das lideranças guarani, lembrou que a liderança das mulheres começa dentro de suas próprias comunidades. Jera, referência entre as Guarani Mbya, comentou que os grandes encontros de mulheres por vezes se tornavam distantes das realidades locais. Ressaltou que ali estavam reunidas mulheres com trajetórias próprias — algumas fundaram suas tekoa, outras dividem responsabilidades com homens nas equipes de liderança. “Não podemos esquecer do nosso quintal”, disse, lembrando que muitas lideranças se afastam de suas comunidades e perdem a conexão com aquilo que as sustenta.
A conversa fluía em várias línguas, mas sempre com sentido. Ana Maria fazia a tradução simultânea entre Yanomami e português, costurando os fios do diálogo com cuidado e paciência. Ao fundo, xejaryi Rosa e suas filhas pitavam, compondo o cenário com quietude e presença.
O almoço nos reuniu novamente ao redor de um banquete coletivo: galinhada, variedades de batata-doce (assadas, cozidas, brancas, laranjas, roxas), feijão com canjica – um prato que os Guarani chamam de jopara. Depois, uma abundância de frutas: melancia, banana, manga, mamão, laranja, mexerica. Comer juntas era também partilhar mundos.
Depois do almoço farto e das intensas trocas da manhã, o corpo pediu descanso. Dormi por algumas horas.
Enquanto dormia, soube que as Guarani mostraram a Ehuana como preparam alguns de seus alimentos tradicionais, como batata doce, mbeju e avaxi hu'i (milho torrado e pilado), além de trocarem experiências sobre suas culturas e saberes.
Nesse momento, em torno do pilão e da fogueira, Ehuana e a parteira e liderança Yara dos Santos, partilharam experiências sobre um dos temas que as unem: os partos. Yara parteira contou de seu trabalho na valorização dos partos na aldeia e se encantou com os relatos e ilustrações de Ehuana sobre a forma como as mulheres yanomami dão à luz sozinhas na floresta, atualmente Ehuana é pesquisadora do projeto Redes de Cuidado (UFMG), voltada para a melhoria do pré-natal entre as Yanomami
Conheça: Yipimuwi thëã oni: palavras escritas sobre menstruação, de Ehuana Yanomami
Acordei por volta das 16h sob a companhia do gatinho branco e, após um lanche rápido, seguimos para a mata, onde gravamos o depoimento de Ehuana para as mulheres yanomami. Ela falou com firmeza e ternura sobre o que estava vivendo ali. Suas palavras, traduzidas com cuidado por Ana Maria, revelaram a admiração pela resistência das lideranças guarani e a conexão entre suas lutas e as do povo Yanomami.
À medida que o sol se despedia, retornamos à casa de reza. Foi ali que passamos a madrugada inteira em cantos e danças junto aos Guarani. O ambiente era marcado por uma espiritualidade densa e acolhedora.
A madrugada transcorreu num tempo próprio: dormíamos e acordávamos, guiadas não pelo relógio, mas pelo ritmo dos cantos guarani e das pausas. Em uma dessas vezes, despertei com a voz de Ehuana preenchendo o espaço com um canto profundo, que me atravessou de um jeito difícil de descrever. Ao seu lado, Ana Maria seguia a melodia yanomami em harmonia, como quem sustenta com cuidado uma ponte entre mundos. Aquela cena me tocou profundamente — havia algo ali de cura, de força compartilhada, de presença plena. Era como se, por um momento, eu escutasse não apenas com os ouvidos, mas com todo o corpo.
“Eu vim conhecer a forma como seus mais velhos bebem o sumo da planta medicinal, pois eu queria conhecer como fazem“, disse Ehuana. E assim, durante o ritual, foi feita a utilização da medicina tradicional dos Guarani, conduzida por eles em seus próprios termos e saberes. Eu, que não participei desse momento de forma direta, observei com respeito e atenção a força do gesto, compreendendo sua importância naquele contexto sagrado.
Entre um repouso e outro, víamos as brasas acesas.
Por volta das seis ou sete horas da manhã, despertei de vez — os Guarani ainda cantavam, embalando a chegada do sol. O céu clareava, e juntas começamos a arrumar a casa de reza, recolhendo os rastros da noite intensa e bonita que havíamos vivido.
“Ali eu pude ver a forma como seus xamãs cuidam da Terra. Ficamos acordadas até sete horas da manhã. Eu não dormi naquela noite, mas fiquei muito emocionada. Da mesma forma como nós, Yanomami, fazemos xamanismo, eles também fazem pela cura da Terra. Isso me deixou muito feliz. E fiquei muito feliz também por ver jovens e moças ali tomando a medicina deles, anciãs que cantavam toda a noite sem dormir”, relatou posteriormente a Ehuana, em evento registrado no podcast ”Floresta no Centro”. Escute aqui!
Em seguida, tomamos café da manhã e seguimos para a casa de artesanato. Lá, fomos todas presenteadas com peças diversas — colares, pulseiras, brincos — inclusive por Jera, que nos ofereceu seus próprios trabalhos com generosidade e firmeza.
Encerramos o intercâmbio com abraços, risos, fotos e trocas de palavras, enquanto a mata ao redor parecia também se despedir, com seus sons e cheiros.
O carro balançava novamente, como no início da viagem, e a mata ia se esvaindo pelos meus olhos na volta para casa — como quem guarda por dentro aquilo que não quer deixar para trás.
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Minidocumentário faz parte da Mostra Ecofalante Pará, que acontece entre os dias 20 de agosto e 3 de setembro; confira a programação gratuita
“Nosso Modo de Lutar” chega a Belém no dia 22/08, às 20h, como parte da Mostra Ecofalante Pará. O curta-metragem traz o olhar de Francy Baniwa, Kerexu Martim e Vanuzia Pataxó sobre a diversidade na luta e resistência entre os povos indígenas, a partir de filmagens de um dos principais espaços de mobilização indígena do país na atualidade, o Acampamento Terra Livre (ATL). A exibição será no Cine Líbero Luxardo, com entrada gratuita.
Realizada em Belém pela segunda vez consecutiva, a Mostra Ecofalante Pará é reconhecida como o mais importante festival sul-americano para o audiovisual socioambiental. A edição deste ano exibirá 45 filmes, entre 20 de agosto e 3 de setembro, com destaque para a participação feminina.
O curta-metragem “Nosso Modo de Lutar” é fruto de uma parceria entre o Instituto Socioambiental (ISA) e a Rede Audiovisual das Mulheres Indígenas, a Katahirine. Sua gravação aconteceu em abril de 2024, durante a 20ª edição do Acampamento, com um enfoque especial à atuação das mulheres na mobilização. Dos 50 entrevistados, elas são a maioria e explicam os saberes dos cantos, das comidas, das pinturas, passados de geração a geração.
Para conferir a programação completa da Mostra Ecofalante Pará acesse https://ecofalante.org.br/programacao. Todas as sessões e debates têm entrada franca e ocorrerão no Cine Líbero Luxardo e no Sesc Ver-o-Peso.
Serviço
Exibição do documentário “Nosso Modo de Lutar” na Mostra Ecofalante Pará
Dia 22, às 20h
Cine Líbero Luxardo
Entrada gratuita.
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Documento construído coletivamente reforça a luta pela demarcação de suas terras, pela justiça climática e pelo fim das violências contra mulheres indígenas
Na última semana, a IV Marcha das Mulheres Indígenas levou os cantos, danças e reivindicações de cerca de 5 mil mulheres indígenas, de mais de 100 povos, às ruas de Brasília. Organizada pela Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga), a Marcha é realizada a cada dois anos, e reúne mulheres indígenas de todos os biomas do país para debater pautas como a demarcação de seus territórios, violência contra a mulher indígena, saúde, educação e bem-viver.
A caminhada em direção à Praça dos Três Poderes terminou com um uma sessão solene em homenagem à IV Marcha das Mulheres Indígenas, no plenário da Câmara dos Deputados, onde ocorreu a entrega ao Congresso Nacional da Carta dos Corpos-Territórios em Defesa da Vida.
"Para nós, mulheres, é sempre um grande desafio oportunizar esse grande encontro, mas principalmente, esse grande debate que nós, mulheres indígenas, fazemos acerca dos temas que são prioritários para nós e que queremos trazer a Brasília para a gente poder ecoar as nossas vozes, ecoar os nossos desejos, mas ecoar também a defesa dos nossos direitos" , afirmou Joziléia Kaingang, diretora-executiva da Anmiga, na plenária.
Na ocasião, a presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joenia Wapichana, destacou a importância do momento: “Estar hoje no Congresso Nacional é reafirmar direitos e também as nossas capacidades”. Ela lembrou ainda as mudanças no cenário político nos últimos três anos, fruto da luta indígena.
Veta, Lula!
Na plenária e nas ruas, o grito “veta, Lula” fortalecia o protesto das mulheres pelo veto à ao Projeto de Lei nº 2159/21, conhecido como PL da Devastação, que coloca em risco a proteção ambiental de seus territórios.
“Esse PL vai causar um grande dano à nossa vida, à nossa saúde, mudando os nossos modos de viver. Porque nós, pajés, vivemos de oração, de cura, das ervas medicinais que ali se encontram e para nós isso é indispensável. Nós protegemos as nossas matas, nós não derrubamos mata em pé.”, lamentou a Pajé Analice Tuxá, do povo Tuxá, em repúdio ao PL.
Ainda na sexta-feira (08/08), o presidente Lula assinou o veto parcial, excluindo 63 dos 400 dispositivos da lei. Agora, o projeto volta ao Congresso, que pode aprovar ainda a derrubada dos vetos.
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Pressão política e eleições 2026
Uma das principais pautas anunciadas na mobilização foi a ampliação no número de mulheres indígenas eleitas no pleito do próximo ano. Atualmente, o Congresso Nacional conta com apenas duas representantes da Bancada do Cocar: Célia Xakriabá e Juliana Cardoso.
"Nós iremos eleger dez deputadas federais para enfrentar a bancada que mais tem atacado o direito dos povos indígenas. Vamos aldear a política e replantar nossas vozes", bradou Célia Xakriabá, durante sessão solene no plenário.
Carta final
A leitura da carta final da IV Marcha das Mulheres Indígenas, “Carta dos Corpos-Territórios em Defesa da Vida”, aconteceu na noite da quinta-feira, e contou com uma apresentação da rapper MC Anarandá, do povo Guarani Kaiowá e um desfile ancestral. “Somos guardiãs do planeta pela cura da terra. Nosso corpo é território. É terra, é água, é semente. E pela força do que somos, vamos transformar o mundo. Estamos em Marcha e caminharemos sempre pelo bem-viver”, afirma o documento.
Conferência histórica e a construção coletiva de políticas públicas
A IV Marcha também foi palco da 1ª Conferência Nacional das Mulheres Indígenas. Realizada entre os dias 4 e 6 de agosto, a Conferência é fruto de uma parceria da Anmiga com os Ministérios dos Povos Indígenas e das Mulheres e integrou a programação da semana.
“Essa conferência nos deu a oportunidade de colocar na mesa do governo federal as propostas prioritárias nos eixos de saúde, educação, emergência climática, defesa dos nossos corpos e gestão ambiental e territorial”, avaliou Joziléia Kaingang.
Ao longo do evento, grupos de trabalho se debruçaram em discussões acerca de cinco eixos temáticos: Direito e Gestão Territorial; Emergência Climática; Políticas Públicas e Violência de Gênero; Saúde; e Educação e a Transmissão de Saberes Ancestrais para o Bem Viver.
Ao fim das discussões, foram priorizadas 49 propostas que integraram o Caderno de Resoluções da Conferência, entregue às ministras Sonia Guajajara e Márcia Lopes em cerimônia de encerramento. O Caderno intitulado “Carta Pela Vida e Pelos Corpos-Territórios: “Nosso corpo é território! Somos as guardiãs do planeta pela cura da terra!”, foi resultado de um processo iniciado nas sete etapas regionais e concluído na Conferência.
Leia o documento completo aqui.
Na cerimônia de encerramento, foi anunciada a assinatura de uma portaria que instaura um Grupo de Trabalho responsável por consolidar as propostas trazidas no Caderno de Resoluções a fim de estabelecer a normativa da Política Nacional para Mulheres Indígenas (PNMI), também anunciada durante o evento. O GT recém instaurado terá caráter interministerial e colaborativo, reunindo diferentes atores como órgãos do governo, lideranças indígenas e representantes da sociedade civil.
A criação do Prêmio Nega Pataxó também foi oficializada na ocasião. Uma homenagem à pajé Maria de Fátima Muniz Andrade, conhecida como Nega Pataxó, do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe, o programa tem como objetivo o fortalecimento da autonomia, da participação política e da proteção integral das mulheres indígena.
Além disso, também foi anunciada a criação do Prêmio Mre Gavião, para comunicadores indígenas, em homenagem a Mre Gavião, fotógrafo e servidor do MPI que faleceu neste ano. Por fim, foi anunciada a reestruturação da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) pela presidenta Joenia Wapichana, que se comprometeu a lutar por um orçamento digno para apoiar as necessidades específicas das mulheres indígenas.
Na cerimônia de encerramento da Conferência, também foram anunciadas as homologações de três Terras Indígenas no Ceará. São elas: A Terra Indígena Pitaguary, do povo Pitaguary; Lagoa Encantada, do povo Jenipapo-Kanindé; e Tremembé de Queimadas, do povo Tremembé. A assinatura das portarias aconteceu no Palácio do Planalto, na quarta-feira (06/08).
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Juliana Alves, conhecida como Cacika Irê, do povo Jenipapo Kanindé e atual Secretária dos Povos Indígenas do Ceará, celebrou a decisão durante a Marcha. “Ontem (06/08) foi um dia significativo, foi um dia muito festivo, nós estamos muito felizes em poder estar festejando um momento desse tão significativo na vida dos povos do estado do Ceará, dentro da nossa IV Marcha”.
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De 16 de agosto a 11 de outubro, com entrada gratuita, a Almeida & Dale Galeria de Arte recebe cerca de 30 desenhos e telas do artista
Com cerca de 30 obras inéditas, a exposição Urihi mãripraɨ – Sonhar a terra-floresta, que inaugura no próximo sábado (16/08) na Almeida & Dale Galeria de Arte, em São Paulo, apresenta a linguagem única de Joseca Mokahesi Yanomami, artista nascido em 1971 que transforma em imagens os sonhos e narrativas xamânicas da floresta amazônica. A entrada é gratuita.
Filho de um grande xamã, Joseca desenvolveu seu traço desde a infância. Na mostra, com curadoria do antropólogo Bruce Albert, o público poderá apreciar desenhos e telas nascidas das interpretações da cosmologia Yanomami, onde humanos, animais, espíritos e a floresta formam uma rede interdependente e viva.
Além de artista, Joseca também é professor. Na década de 1990, ele fundou a primeira escola yanomami em sua comunidade, incentivando jovens e crianças a se alfabetizarem na língua yanomae. Nesse período, participou da produção de diversas cartilhas bilíngues (yanomae/português) para os programas de educação escolar e de saúde.
Exposições nacionais e internacionais
A convite de Bruce, amigo de longa data do artista, Joseca participou em 2003 de sua primeira exposição, L’Esprit de la Forêt na Fondation Cartier, Paris, França, e começou a circular em exposições nacionais e internacionais.
Realizou sua primeira individual, Kami Yamakɨ Urihipë [Nossa Terra Floresta], no MASP, São Paulo, Brasil (2022). Participou da 60ª Bienal de Veneza, Itália (2024). Destacam-se também exposições coletivas como: Maxita Yano, Instituto Inhotim, Belo Horizonte, Brasil (2025); Badu Gili: Healing Spirit, Ópera de Sydney, Austrália (2024); Dancing With All: The Ecology Of Empathy, 21st Century Museum of Contemporary Art, Kanazawa, Japão (2024); 38º Panorama da Arte Brasileira, MAM São Paulo, Brasil (2024); Siamo Foresta, Triennale Milano, Milão, Itália (2023); Histórias Indígenas, MASP, São Paulo, Brasil (2023); Les Vivants, Le Tripostal, Lille, França (2022); Moquém Surarî: arte indígena contemporânea, MAM São Paulo, Brasil (2021); e Trees, Power Station of Art, Xangai, China (2021).
Sua obra está presente nas coleções da Fondation Cartier pour l’art contemporain, França; MAM São Paulo, Brasil; e MASP, Brasil.
A representação de Joseca Yanomami é uma parceria entre a Almeida & Dale e a Hutukara Associação Yanomami.
Serviço
Urihi mãripraɨ – Sonhar a terra-floresta
Exposição individual de Joseca Mokahesi Yanomami
Curadoria: Bruce Albert
De 16 de agosto a 11 de outubro de 2025
Segunda a sexta, 10h às 19h | Sábado, 11h às 16h
Almeida & Dale Galeria de Arte Rua Fradique Coutinho, 1360, São Paulo, SP
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Episódio gravado celebra trajetórias e apresenta histórias de resistência no campo das artes, do ativismo, da espiritualidade e da escrita
O Instituto Socioambiental (ISA) lança o podcast “Floresta no Centro”, para estimular escutas e trocas sobre territórios, culturas e resistências. Os episódios são gravados em eventos realizados na Floresta no Centro, espaço do ISA na Galeria Metrópole, na capital paulista, que apresenta saberes de comunidades do Xingu, Rio Negro e Vale do Ribeira por meio de itens tradicionais, exposições, encontros e publicações da organização e de parceiros para visitantes.
Na estreia, as trajetórias de Ehuana Yanomami, professora, pesquisadora, artista plástica e liderança do povo Yanomami, e Gení Núñez, psicóloga, escritora, pesquisadora e ativista guarani, se fundem em uma conversa exclusiva, densa e sensível, mediada por Ana Maria Machado, tradutora de línguas e de mundos, antropóloga e indigenista com mais de uma década de atuação junto ao povo Yanomami.
Durante o episódio, Ehuana compartilha durante sua fala seus sentimentos ao visitar a Aldeia Guarani Kalipety, na Terra Indígena Tenondé Porã, em São Paulo. Segundo ela, foi a primeira vez que ela esteve em um território Guarani.
“Eu vi como eles fortalecem suas roças, valorizam os próprios alimentos [...] e fiquei muito feliz com tudo aquilo. Eles são também Yanomami, são indígenas. Temos os mesmos olhos e a mesma pele”, disse. “Mesmo que São Paulo cerque seus territórios, e eles sofram com isso, ao mesmo tempo, eles se mantêm fortes, mantêm suas línguas, escrevem e foi muito bom ver como eles fizeram a retomada. Os Guarani são muito fortes”, finalizou.
O episódio atravessa temas como território, espiritualidade, cuidado, linguagem e ancestralidade – da floresta ao centro urbano, do corpo à escrita.
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Troca de saberes com Ehuana Yanomami e Geni Núñez em SP
Durante a conversa, Gení Núñez ressalta como o modo de vida tradicional é uma forma de resistência e barreira contra a colonização, que mantêm o povo Guarani vivo.
“Muitas vezes o nosso povo é descrito como um povo pacífico e isso é traduzido como se nós fossemos muito obedientes ou muito em sintonia com esse processo colonial, mas isso esconde a resistência do nosso povo, porque mesmo depois de tantos séculos, a gente tem orgulho em dizer que há parentes que não falam nenhuma palavra em português”, disse.
“Esse movimento de manter a língua, os costumes, o modo de vida tradicional, ele segue tendo a espiritualidade no centro”, explicou.
Gení homenageia Ehuana com um poema, que pode ser conferido na íntegra na sua plataforma de áudio favorita.
Gravado durante os eventos realizados no Espaço Floresta do Centro (https://loja.socioambiental.org/), em São Paulo, o podcast é uma realização do Instituto Socioambiental (ISA) e faz parte de um esforço coletivo para amplificar vozes originárias e tradicionais.
O podcast Floresta no Centro tem apoio da Fundação Rainforest da Noruega.
Créditos
Identidade visual: Cama Leão
Captação de áudio, identidade sonora e edição: Voz Ativa Produções
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Neste momento de dor, o ISA se solidariza com a família e amigos e reverencia o legado de sua obra
Foi com imensa tristeza que o Instituto Socioambiental (ISA) recebeu a notícia do falecimento de Rosa Gauditano, ocorrido em 7 de agosto de 2025, aos 70 anos. Rosa foi uma fotógrafa e ativista que dedicou parte de sua vida à luta pelos direitos das populações indígenas no Brasil.
Reconhecida parceira e aliada do movimento indígena, ela compareceu ao Encontro de Altamira, que reuniu mais de 600 lideranças indígenas em 1989, no Pará, e desde então dedicou-se a documentar a realidade de povos como os Karajá, Kayapó, Tukano, Yanomami, Xavante, Guarani e Pankararu.
Rosa também se destacou publicando livros como Índios: Os Primeiros Habitantes (1998), Raízes do Povo Xavante (2003) e Guaranis M'Byá na Cidade SP (2006), e escreveu crônicas para o jornal Público, nas quais alertava sobre a situação dos povos indígenas durante a pandemia de Covid-19.
O legado de Rosa Gauditano é uma contribuição fundamental para a memória visual e histórica do Brasil. Sua obra continuará a inspirar gerações de ativistas na luta pelos direitos dos povos indígenas.
Neste momento de dor, o ISA se solidariza com a família e amigos, em especial Camila Gauditano, ex-colaboradora do ISA, sua filha e atualmente supervisora do Centro de Pesquisa e Referência do Museu das Culturas Indígenas (MCI).
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Movimento indígena comemora a regularização dos territórios Pitaguary, Lagoa Encantada e Tremembé de Queimadas, mas lamenta demora na decisão
Em evento no Palácio do Planalto nesta quarta-feira (06/08), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou os decretos de homologação das Terras Indígenas Pitaguary, Lagoa Encantada e Tremembé de Queimadas ao lado da Ministra Sônia Guajajara, Joênia Wapichana, presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), da Secretária dos Povos Indígenas do Ceará, Juliana Alves Jenipapo Kanindé, e da Secretária de Gestão Ambiental e Territorial Indígena do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Ceiça Pitaguary.
Todas no estado do Ceará, as TIs somam 4.238 hectares e são territórios tradicionais dos povos Tremembé, Jenipapo-Kanindé e Pitaguary. Os processos de demarcação das áreas demoraram em média 25 anos para serem finalizados.
O anúncio aconteceu ao mesmo tempo em que ocorre, em Brasília, a IV Marcha das Mulheres Indígenas, realizada pela Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga) e foi recebido com celebração pelo movimento. Com as novas assinaturas, o terceiro mandato do presidente homologou 16 Terras Indígenas, e o Ministério da Justiça declarou os limites de dez áreas. No entanto, a cobrança pelo cumprimento da promessa feita por Lula de homologar o máximo de TIs possíveis durante o seu mandato, segue intensa.
Segundo Cacica Irê, do povo Jenipapo Kanindé, atual Secretária dos Povos Indígenas do Ceará, a homologação dessas áreas foi fruto da parceria e da articulação do estado junto a Funai e MPI. Em novembro de 2023, a Funai, o Instituto do Desenvolvimento Agrário do Ceará (Idace) e a Secretaria dos Povos Indígenas do Ceará (Sepince) assinaram um Acordo de Cooperação Técnica com o objetivo de realizar a demarcação física e o levantamento de benfeitorias instaladas por terceiros em quatro Terras Indígenas. Para além das áreas homologadas ontem, resta a homologação da Terra Indígena Tapeba, que também fazia parte do acordo. Para ela, a demarcação dessas TIs é muito significativa dentro de um estado que por tantos anos invizibilizou a presença desses povos.
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No Brasil existem 809 Terras Indígenas em diferentes estágios de reconhecimento. Dessas, 521 áreas já estão com o processo finalizado, sendo que o restante ainda está em alguma das etapas do processo de demarcação. São 265 TIs com processo em andamento na Funai, 65 delas, aguardam apenas a homologação pelo presidente Lula. No processo administrativo de demarcação de Terras Indígenas, a homologação pela presidência da República é um dos últimos passos, faltando apenas o registro no cartório.
"Essas demarcações sinalizam um avanço, mas o atual cenário é preocupante. São muitos retrocessos dos direitos indígenas, e o processo de demarcação vem sendo afetado com a aprovação da Lei do Marco Temporal", afirma Moreno Martins, coordenador do Programa Povos Indígenas no Brasil, do ISA.
No estado do Ceará, são 10 Terras Indígenas, totalizando agora cinco homologadas, uma declarada, uma delimitada, duas em estudo e uma Reserva Indígena em processo de regularização. A área total é de 21.648,00 hectares.
Contexto das três Terras Indígenas
A Terra Indígena Pitaguary, localizada nos municípios de Maracanaú e Pacatuba (CE) - zona metropolitana de Fortaleza, foi homologada com 1.731 hectares. Desde 2006, quando o MJSP assinou a Portaria Declaratória do território, o povo Pitaguary aguardava a conclusão do processo de demarcação, iniciado há 28 anos.
A luta pelo território é antiga, com registros de solicitações realizadas por lideranças do povo para que o governo tomasse providências contra os invasores do território ainda no século XIX. A TI Pitaguary teve o processo de demarcação física concluído em outubro de 2024, mas até esse marco, foi palco de muitos episódios de violência, entre eles, um ataque à Cacica Madalena, em 2018.
Do povo Jenipapo Kanindé, a Terra Indígena Lagoa Encantada, localizada em Aquiraz (CE), estava em processo de demarcação desde 1997 e aguardava a homologação há 14 anos. A área de 1.732 hectares, onde vivem 382 pessoas (IBGE, 2022), é casa da cacica Maria de Lourdes da Conceição Alves, a Cacica Pequena, tida como a primeira cacica mulher do país, uma referência da força feminina no movimento indígena.
Cacica Irê, filha de Cacica Pequena, reforçou a importância do movimento de mulheres nesse contexto. “Estamos muitos felizes em poder estar festejando um momento desses tão significativo na vida dos povos do Ceará dentro da nossa IV Marcha Nacional das Mulheres Indígenas”.
Comentou ainda sobre a necessidade da luta continuar pela homologação de outras TIs: "Nós temos fé e esperança que daqui para o final do ano o presidente Lula vai sancionar e homologar a Terra Indígena do povo Tapeba”, disse. “Afinal de contas, o povo Tapeba é muito merecedor de ter sua homologação do seu território, uma vez que foi o primeiro povo no estado do Ceará que fincou o pé e demarcou a luta dizendo 'nós existimos!', completou.
A lentidão do processo de demarcação se explica em parte por conta do conflito judicial envolvendo o Grupo Ypióca, que explorava recursos hídricos da Lagoa Encantada para irrigação de plantio de cana de açúcar. Uma filial ligada ao grupo recorreu judicialmente para anular o processo de demarcação. Em 2017, o Supremo Tribunal de Federal rejeitou recurso apresentado pela empresa e afirmou a validade do processo de demarcação.
Já no caso da Terra Indígena Tremembé de Queimadas, localizada em Acaraú (CE), a espera para a conclusão do processo de demarcação chegou a 20 anos. Agora, o povo Tremembé espera a regulação de outras duas TIs com processo em andamento: Tremembé de Almofala e Tremembé do Engenho.
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Escrito em Baniwa, Nheengatu e português, obra editada pelo INPA alia o conhecimento tradicional dos Baniwa à pesquisa científica
Espécies de Aves do Rio Cubate: Terra Indígena do Alto Rio Negro venceu nesta terça-feira (05/08), em São Paulo, o Prêmio Jabuti Acadêmico 2025 no eixo Ciências Biológicas, Biodiversidade e Biotecnologia.
Publicado pela Editora do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), o livro é resultado de uma parceria entre pesquisadores do instituto e autores da comunidade Baniwa da aldeia de Nazaré, e contou com a colaboração do Instituto Socioambiental (ISA) e da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) no município de São Gabriel da Cachoeira (AM).
O conteúdo reúne registros de 310 espécies de aves observadas na região do Rio Cubate, com informações detalhadas sobre nomes tradicionais, habitats, alimentação e comportamentos.
Escrito em Baniwa, Nheengatu e português, o livro alia o conhecimento tradicional dos Baniwa à pesquisa científica, e foi concebido desde o início como ferramenta para fortalecer o ensino nas escolas indígenas e a autonomia cultural das comunidades locais.
Para Dzoodzo Baniwa, educador, pesquisador, liderança indígena e um dos organizadores da obra, o livro atende a uma demanda da própria comunidade de Nazaré, que vislumbra o potencial do levantamento das aves para futuras iniciativas de ecoturismo.
Dzoodzo também destaca a importância do reconhecimento como um convite à comunidade científica a rever a forma histórica de produção de conhecimento, propondo a atualização de metodologias participativas e colaborativas que incluam as comunidades indígenas e/ou locais e seus saberes. “Receber o Prêmio Jabuti Acadêmico é reconhecer a importância da construção colaborativa do conhecimento científico intercultural baseado na valorização de saberes locais e conhecimentos científicos. Isso é o que o nosso livro traz”.
O projeto foi conduzido por meio de oficinas, expedições e deliberações comunitárias, com todas as decisões editoriais sendo aprovadas em assembleia na aldeia de Nazaré.
O livro não apenas registra a biodiversidade do Alto Rio Negro, mas também afirma a potência dos saberes indígenas como base legítima para a produção de conhecimento científico e a conservação ambiental.
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‘Uma Enciclopédia nos Trópicos: memórias de um socioambientalista’ vence o Jabuti Acadêmico 2025
A obra foi organizada por Dario Baniwa, Dzoodzo Baniwa, Damiel Legario Pedro, Estevão Fontes Olímpio, Gracilene Florentino Bittencourt, Camila Cherem Ribas, Fernando Mendonça d’Horta e Ramiro Dário Melinski.
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Lançado em 2024, livro destaca o legado de Beto Ricardo, fundador do ISA, e reúne memórias e documentos sobre a defesa dos direitos dos povos indígenas no Brasil
O livro Uma Enciclopédia nos Trópicos: memórias de um socioambientalista, de um dos fundadores do Instituto Socioambiental (ISA), o antropólogo Beto Ricardo, e do escritor e jornalista Ricardo Arnt, foi o vencedor do Prêmio Jabuti Acadêmico 2025 na categoria Antropologia, Sociologia, Demografia, Ciência Política e Relações Internacionais.
A cerimônia de premiação aconteceu nesta terça-feira (05/08), no Teatro Sérgio Cardoso, em São Paulo, e reuniu autores, editoras e representantes de instituições acadêmicas de todo o país. Carolina Ricardo, filha de Beto Ricardo, recebeu o prêmio ao lado de Ricardo Arnt e Ricardo Teperman, publisher da Zahar, selo do Grupo Companhia das Letras responsável pela publicação da obra.
Lançado em 2024 e organizado por Jurandir Craveiro, ex-presidente do ISA, o livro reúne reflexões, relatos e documentos essenciais da trajetória de Beto Ricardo e da organização. Jurandir destaca que relembrar histórias, orientar pesquisas e selecionar fotos e mapas não foi uma tarefa fácil para Beto, que enfrenta há alguns anos o Mal de Parkinson.
“Em 2021, ele pressentiu que, em algum momento, talvez não estivesse mais apto a levar adiante o projeto. Com os pés no chão e determinação, não hesitou em me pedir ajuda. Durante quase três anos, com o apoio da família, cuidadoras, amigos e companheiros do ISA, estive junto do Beto para que conseguisse nos contar a histórias da sua vida e suas lutas. Não sem sacrifício, com amor e paciência, ele concluiu a obra, deixando um legado inspirador”, afirmou.
O livro resgata momentos-chave da criação e consolidação do campo socioambiental no Brasil, revelando bastidores do movimento indigenista e destacando contribuições de figuras como Darcy e Berta Ribeiro, Davi Kopenawa, Lula, Marina Silva, Milton Nascimento e Gilberto Gil, entre outros.
Veja imagens históricas de Beto Ricardo que constam no livro:
Um dos marcos narrados é a criação do programa Povos Indígenas no Brasil, herança que o ISA recebeu do Centro Ecumênico de Documentação e Informação (CEDI) e que reunia, sistematizava e divulgava informações cruciais sobre os povos indígenas em um período em que o Estado brasileiro insistia em negar sua existência. O programa criou à Enciclopédia “Pibão”, como ficou conhecida a base de dados pioneira, referência nacional e internacional e alicerce fundamental para o trabalho do ISA.
Com prefácio do escritor e ativista indígena Ailton Krenak e posfácio do jornalista Leão Serva, o livro encerra com o capítulo “O céu que nos protege”, onde Beto alerta para os efeitos da crise climática no Brasil. O texto enfatiza a urgência do protagonismo dos povos tradicionais e a valorização da sociobiodiversidade para a preservação da vida no planeta.
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Livro com autoria indígena sobre aves do Alto Rio Negro conquista Jabuti Acadêmico 2025
Veja como foi a cerimônia:
Sobre os autores
CARLOS ALBERTO (“BETO”) RICARDO é antropólogo e ativista desde a resistência à ditadura militar no Brasil. Foi um dos fundadores do Centro Ecumênico de Documentação e Informação (Cedi), criou e editou a série Povos Indígenas no Brasil junto com Fany Ricardo, recebeu o prêmio Goldman de Meio Ambiente de 1992 e fundou diversas organizações, como o Instituto Socioambiental (ISA), o Instituto Atá e a Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada (Raisg).
RICARDO ARNT é jornalista e escritor. Foi editor da Folha de S. Paulo, do Jornal do Brasil, do Jornal Nacional da TV Globo, da TV Bandeirantes e das revistas Exame, Superinteressante e Planeta. É autor de vários livros, entre os quais O que é política nuclear (1983); Um artifício orgânico: Transição na Amazônia e ambientalismo (1992); Jânio Quadros: O Prometeu de Vila Maria (2004); e O que os economistas pensam sobre sustentabilidade (2010).
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