MP do Licenciamento Especial editada pelo governo junto com vetos ao PL 2.159 recebeu 833 propostas; 74% ressuscitam dispositivos vetados por Lula e 80% são retrocessos
Do Observatório do Clima (OC) - Nota técnica divulgada hoje (18/9) pelo Observatório do Clima (OC) revela que deputados e senadores tentam retomar retrocessos vetados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no projeto de lei (PL) que tentou destroçar o licenciamento ambiental do país. Das 833 emendas apresentadas à Medida Provisória 1.308/2025, que Lula mandou ao Congresso para regulamentar parte da legislação vetada, 616 (74%) reintroduzem itens excluídos no mês passado por Lula na sanção da Lei 15.190. Essa lei resultou da aprovação do PL 2.159, que tramitou por mais de 20 anos no Legislativo e ficou conhecido como "PL da Devastação". Do total de propostas, 80% representam recuos em relação ao que o Executivo procurou corrigir.
Leia a Nota Técnica completa aqui.
Assinada por Lula no mesmo dia do anúncio dos vetos ao PL da Devastação, a MP 1.308 valida uma licença acelerada (a Licença Ambiental Especial, ou LAE) para empreendimentos considerados “estratégicos”. Idealizada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre, a modalidade cria atalhos para empreendimentos como a exploração de petróleo na Foz do Amazonas, a pavimentação de estradas e a liberação de outros projetos de grande impacto ambiental, que passariam a ser aprovados em modalidade fast track, por decisão meramente política.
O OC recomenda a rejeição integral da MP ou a aprovação de substitutivo com salvaguardas socioambientais. Segundo a nota do OC, ao instituir a modalidade monofásica de licenciamento (em substituição ao processo atual, em três fases e proporcional ao impacto do empreendimento), a MP pode significar o maior retrocesso ambiental recente do Brasil.
Na prática, LAE cria um licenciamento por pressão política, violando os princípios de prevenção, precaução, publicidade e transparência, previstos no artigo 225 da Constituição Federal, fragiliza o controle social e amplia a insegurança jurídica.
A Nota Técnica divulgada hoje mostra que, com as emendas do Congresso, os retrocessos podem ser ainda mais graves. Além das 616 propostas que ressuscitam dispositivos vetados na Lei Geral do Licenciamento, há 31 “jabutis”, temas estranhos ao objeto da MP, e 23 novos retrocessos ambientais, totalizando 670 emendas de ataque à legislação ambiental brasileira. Apenas 11,4% das propostas (95 emendas) trazem avanços.
As emendas de retrocessos cortam caminho no licenciamento com dispensas ou extensão da Licença por Adesão e Compromisso (LAC), o “autolicenciamento” que Lula tentou disciplinar em seu veto; esvaziam órgãos técnicos e a participação social; pioram a Licença Ambiental Especial ao encurtar etapas e prazos; enfraquecem a Lei da Mata Atlântica; excluem terras indígenas não homologadas, territórios quilombolas não titulados e comunidades tradicionais do processo de licenciamento, entre outros.
O Partido Liberal (PL), do golpista condenado Jair Bolsonaro, responde por 25% das emendas totais e por 30,4% de retrocesso, seguido do Progressistas (PP), com 18,2% dos retrocessos.
Com as emendas à MP, o Congresso nem sequer precisa examinar os vetos de Lula em sessão conjunta: pode simplesmente usar a MP, que já está em vigor, como cavalo-de-troia para reconstruir o PL da Devastação inteirinho e ir além dele com os jabutis. E tudo isso do jeito que a pior legislatura da história mais gosta: na surdina, sem debate e sem controle social.
“Não há segurança jurídica sem licenciamentos proporcionais ao impacto, com técnica forte, transparência e controle social. Reabrir vetos e acelerar um atalho monofásico é reeditar o PL da Devastação. O país precisa de previsibilidade e salvaguardas socioambientais”, diz Adriana Pinheiro, assessora de incidência política do Observatório do Clima.
“A Licença Ambiental Especial dificilmente será aperfeiçoada. Ela não deveria existir. Pode-se aceitar a priorização dos processos considerados pelo governo, o que já ocorre na prática. Mas agilizar empreendimentos com alto potencial de impacto é inverter a lógica estabelecida pela própria Constituição, que nos princípios da ordem econômica prevê tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental”, avalia Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima.