Espécies de pequi, buriti, jenipapo e urucum foram selecionadas para manter costumes alimentares e culturais
Abundância é a palavra que define o plantio realizado em dezembro do ano passado na Aldeia Sapezal, em Querência (MT). Mais do que cumprir metas globais de restauração, a iniciativa busca resgatar e proteger tradições culturais e recursos naturais essenciais para a sobrevivência da comunidade.
O plano integrou a semeadura direta com muvuca e a implantação de um Sistema Agroflorestal (SAF) utilizando sementes locais, promovendo sustentabilidade e fortalecendo os laços com os saberes ancestrais.
Na área de 12,5 hectares - outros 12 foram implantados em 2023 -, às margens do Rio Kuluene, nos limites do Território Indígena do Xingu, teve semeadura direta de muvuca para restauração e implantação do SAF com plantio em covas de sementes das espécies de interesse cultural.
Na agrofloresta, também tem pequi de sementes das próprias aldeias, que, além de alimentar a comunidade, poderá ser comercializado.
Na ambiciosa lista de objetivos estão:
1 - Manejo do fogo - Plantar aproveitando para manejar o capim à beira da estrada
2 - Restauração - substituir capim por floresta
3 - Preservar tradição da cultura alimentícia, artística e ritualística
4 - Cultivar plantas de interesse cultural e econômico
“Eles querem abundância de pequi dos indígenas do Xingu, buriti, jenipapo e urucum. Pequi para alimentação, buriti para cobertura, utensílios e artesanato e jenipapo e urucum para pintura corporal, porque o Alto Xingu está deixando de pintar os corpos com jenipapo e urucum, usando nankin no lugar”, explicou a ecóloga Kátia Ono, do Instituto Socioambiental (ISA).
Segundo ela, a comunidade escolheu estas espécies para resgatar e manter os costumes alimentares e culturais, para consumo interno e externo. “Estão colocando floresta no lugar do capim, evitando o fogo, resgatando aspectos culturais importantes e também com geração de renda”, completou.
Cuidado com a floresta
O trabalho de semear durou oito dias e envolveu não apenas a comunidade kalapalo da Aldeia Sapezal, como também técnicos do ISA, Redário e Rede de Sementes do Xingu. “Nós temos mais de cinco mil pés de pequi. Temos que plantar roça, frutas e plantar uma coisa que pode sustentar a comunidade, que pode tornar essa área em uma renda e a gente tá falando do pequi, do urucum. A gente compra bananas e frutas no mercado, sabendo que a gente tem uma área para plantar”, afirmou Bilú Kalapalo, responsável da comunidade pela ação.
De acordo com as informações da engenheira florestal e técnica do ISA, Lara Aranha Costa, o preparo do solo foi mecanizado e a muvuca semeada manualmente. “A muvuca de 1,5 toneladas foi composta por 69 diferentes espécies - nove espécies de adubação verde e 60 espécies arbóreas e arbustivas nativas. Com esse plantio, a área total é de 24,5 hectares, implantados entre 2023 e 2024, e sete hectares de regeneração natural”, informou.
“Os indígenas cuidam quando algo faz sentido. Por isso, trazer a lógica agroflorestal para a restauração e a ideia de colocar pequi, urucum e jenipapo. Os indígenas têm uma relação de cuidado com as espécies, porque se relacionam com elas, fazem sentido para eles. Elas os engajam para o cuidado. E o cuidado melhora a qualidade da floresta que virá”, finalizou Kátia Ono.