Após dez anos de espera, Restrição de Uso foi assinada a partir de determinação do Supremo Tribunal Federal (STF)
Visando a proteção integral do povo isolado conhecido como Mashco, no dia 18/01, a presidente substituta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Mislene Metchacuna Martins Mendes, assinou a portaria que restringe o acesso à Terra Indígena Mashco do Rio Chandless, localizada entre os municípios de Manoel Urbano, Santa Rosa do Purus e Sena Madureira, no Acre.
A TI teve sua portaria de Restrição de Uso publicada graças à determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) para que a Funai adote todas as medidas necessárias para a proteção dos territórios com presença de povos indígenas isolados e de recente contato, no âmbito da ADPF 991. A corte também decidiu que a renovação das portarias deve ser garantida antes do término do período de vigência, até que elas sejam definitivamente demarcadas ou que a presença de indígenas isolados seja descartada.
Agora, a entrada na área de 538 mil hectares só poderá ser feita a partir de autorização com validade limitada emitida pela Coordenação-Geral de Indígenas Isolados e de Recente Contato (CGIIRC/Funai). Além disso, a portaria também proíbe a exploração de recursos naturais na área.
“A medida está dentro das determinações da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 991 que estabelece que se tem povos indígenas isolados, deve também existir uma ação de proteção específica. No caso dessa Terra Indígena, esse é um registro de isolados que já foi confirmado há bastante tempo e está sobreposta a uma área de proteção integral que é o Parque Estadual Chandless”, explica Tiago Moreira, pesquisador do Instituto Socioambiental (ISA).
Para a indigenista e sócio-fundadora do Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (OPI) Maria Emília Coelho, que já relatou a situação de povos isolados em duas edições da coletânea Povos Indígenas no Brasil, do ISA, “é importante agora que exista uma articulação entre os órgãos governamentais para que esse trabalho de proteção seja feito com efetividade”.
Ela também explica que apesar do hiato de dez anos entre a confirmação oficial da presença na região e da publicação da portaria de Restrição de Uso, existem relatos sobre o povo Mashco em território brasileiro desde os anos 1970.
Foi só nos anos 1970 que a Funai se estabeleceu na região. Na época, ainda sob o regime ditatorial, não existiam as políticas de proteção aos povos isolados que estão em vigor atualmente. Por exemplo, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), adotada pelo Brasil e que garante o direito à autodeterminação dos povos indígenas, entrou em vigor no Brasil apenas em 2003.
Assim, mesmo com a presença do órgão indigenista no território, a confirmação oficial da presença dos isolados Mashco veio apenas em 2015, após uma expedição da Funai e da Secretaria do Meio Ambiente do Acre (Sema-AC) no Parque Estadual Chandless.
Para a Funai, existem três tipos de registros de povos indígenas isolados: os “em informação”, quando são relatadas a possível existência de um povo isolado; “em estudo”, quando são reunidos conjunto de dados ou relatos sobre a existência de um povo isolado; e “confirmado”, quando, por meio de trabalhos de localização como o que foi feito na expedição, são identificados os territórios habitados por um povo isolado. A partir da confirmação, são necessárias medidas efetivas de proteção, como é o caso da Portaria de Restrição de Uso.
“A restrição de uso é um instrumento frágil que depende apenas de uma assinatura de um presidente da Funai. Se muda a conjuntura política e a presidência da Funai, essa proteção pode cair. Por isso é importante que os estudos de identificação e de localização sejam concluídos para que essa Terra Indígena seja declarada e que se reconheça essa área que deve ser demarcada”, defende Maria Emília Coelho
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Os Mashco são um povo transfronteiriço que se desloca entre o Brasil e o Peru, com maior presença no lado peruano da fronteira – ainda que existam relatos de cada vez mais frequentes em território brasileiro em razão de ameaças e pressões como exploração madeireira e o avanço do narcotráfico no país vizinho. O território mashco se estende pelas divisas dos rios Juruá, Madre de Dios/Madeira, Purus e Ucayali e possui áreas de proteção em ambos os lados da fronteira. Falantes de uma língua da família Arawak, os Mashco são conhecidos pelas suas habilidades de caça.
Confira mais sobre o povo Mashco e os desafios para a sua proteção integrada no artigo especial da publicação “Cercos e resistências: povos indígenas isolados na Amazônia brasileira”, de 2019, do ISA.
Leia na íntegra abaixo:
O povo isolado Mashco no Brasil e os desafios de uma proteção integrada na fronteira com o Peru
Maria Emília Coelho, sócio-fundadora do Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (OPI) e presidente do conselho diretor da Comissão Pró-Indígenas do Acre
Na Amazônia ocidental, entre os limites de Brasil e Peru, estão os indígenas Mashco ou Mashco-Piro, como foram sendo denominados ao longo do processo de colonização desta região de fronteiras, séculos atrás. Hoje, a literatura os considera um povo em “isolamento voluntário”, caracterizado por se organizar em diferentes grupos e subgrupos que se deslocam sazonalmente em um extenso território de floresta. No inverno amazônico, ocupam as zonas altas e terras firmes das cabeceiras. No verão seco, descem às margens dos igarapés e os cursos dos rios, deslocando-se entre os limites internacionais (Clark; Michael; Beier, 2005; Huertas, 2015).
Reconhecidos como exímios caçadores, falam uma língua da família linguística arawak, muito próximo à língua do povo Yine, no Peru, como dos seus parentes Manchineri, no Brasil. Sobreviventes das correrias praticadas contra indígenas no auge do caucho e da seringa, na virada dos séculos XIX e XX, refugiaram-se nas áreas de difícil acesso da floresta, onde não havia borracha. Antropólogos acreditam que, no caminho ao “isolamento”, aspectos da sua vida social sofreram drásticas transformações, como o abandono da agricultura e a atividade de caça e coleta como estratégia de sobrevivência (Gow, 2011; Huertas, 2002; Shepard, 1996; 2017). Atualmente, o território mashco está situado no divisor de águas dos grandes rios Juruá, Madre de Dios/Madeira, Purus e Ucayali, em uma região composta por diferentes categorias de Áreas Protegidas, que constituem um importante mosaico para a conservação ambiental e um corredor de territórios indígenas onde habitam diversos povos isolados. Sua maior parte está em solo peruano, abarcando diversos rios e igarapés em uma extensa área.
No Brasil, existem registros da presença dos Mashco nos altos rios Acre, Iaco, Chandless, Envira e Purus, próximo aos limites da fronteira. Diferentes grupos e subgrupos mashco, vindos do Peru, entram em território acreano pelos rios binacionais Iaco (TI Mamoadate), Acre (Estaçã o Ecológica Rio Acre), Chandless (Parque Estadual Chandless) e Envira (TI Kampa e Isolados do Rio Envira). No lado brasileiro, seus deslocamentos costumam acontecer no verão amazônico, quando descem igarapés e rios para a coleta de produtos da floresta (Aquino; Meirelles, 2014).
Movimentação no Brasil
Os primeiros relatos sobre a existência dessas populações isoladas começaram a ser registrados de forma sistemática no Brasil a partir da chegada da Funai no alto rio Iaco e da instalação do Posto Indígena Mamoadate e da aldeia Extrema, entre 1975 e 1976, assentando indígenas Manchineri e Jaminawa. Na época, o sertanista José Carlos dos Reis Meirelles observou que esses isolados eram chamados de Masko pelos Jaminawa, seus “inimigos tradicionais” e com uma relação de conflito perpetuada por décadas. Os processos de contato dos Jaminawa e Manchineri com os não-indigenas foram empurrando os Mashco para regiões menos habitadas, para as cabeceiras dos rios Iaco, Envira, Chandless e Purus.
José Correia da Silva Tunumã, grande cacique jaminawa e primeiro intérprete no contato com o “povo do Xinane”, em 2014, afirma que esses indígenas já conheciam a palavra Masko quando eram “isolados”, para se referirem ao grupo sem contato que anda pelas cabeceiras do rio Envira:
“A gente chama Masko. Mashco-Piro é no Peru. Eu não sei como inventaram isso, mas desde que me conheço por gente é Masko. Quando fui lá, nem puxei assunto e eles falaram para mim ter cuidado se não os Masko matavam nós. Eles já tinham essa noção desde a primeira vez que falei com eles”.
As possíveis rotas, antigas e atuais, utilizadas pelos Mashco são parte do imaginário coletivo das comunidades jaminawa e manchineri do Alto Iaco, pois seus moradores compartilham territórios e recursos naturais com esses grupos há muito tempo. Hoje, os mais velhos da TI Mamoadate contam que, segundo seus pais e avós, os Mashco andavam até a região onde é a aldeia Extrema.
Otávio Brasil Manchineri, antigo cacique da Extrema, e seu filho, Lucas Artur Brasil Manchineri, proeminente liderança, acreditam na existência de dois grupos distintos que andam em diferentes rotas no Alto Iaco, na fronteira com o Peru. Para Lucas, o que caracteriza a diferença entre os grupos é o tamanho do rastro de seus indivíduos:
“Eles vão no encontro daquelas cabeceiras todas. E ali tem dois grupos, um do rastro grande e um do rastro pequeno. O ano que o rastro pequeno passa, o rastrão não passa. E o ano que o rastrão passa, o do rastro pequeno não passa. Tem essa diferença e alternância. Acho que eles já sabem quando os do pé grande passam, aí não vão. Às vezes, eles já têm até alguma ligação, e aí não se encontram”.
Otávio e Lucas afirmam que existem grupos que se diferenciam também por usarem, ou não, instrumentos de ferro e metal. “O grupo que anda no Chandless usa terçado, já o grupo que anda no alto Iaco é outro, e não usa”. Eles acreditam que Yine, Manchineri e Mashco falam a mesma língua, porque são parte de um mesmo povo. Lucas sugere que os Manchineri deveriam colocar seus intérpretes em uma possível situação de contato no Brasil e afirma que eles estão se aproximando das aldeias em suas andanças e reocupando antigos territórios. Nos últimos dois anos, os moradores de Extrema encontraram seus vestígios a poucos quilômetros da comunidade.
Intensificação das evidências
Nos últimos anos, os vestígios e aparições dos Mashcos se intensificaram nas áreas hoje constituídas pelas TIs Mamoadate e Kampa e Isolados do Rio Envira. Entre 2015 e 2016, foram registradas três situações de conflitos no alto Envira envolvendo os Mashcos e o “povo do Xinane”, resultando na morte de um indígena de recente contato.
Nos altos rios Acre, Chandless e Iaco, não existe uma situação de contato iminente, mas uma série de evidências que apontam novas formas de uso e deslocamento e/ou processo de reocupação territorial. Em 2014, um acampamento mashco foi encontrado pela primeira vez pelas equipes do ICMBio e da Funai em uma área bem próxima à Base da Estação Ecológica Rio Acre.
Em 2015, uma expedição conjunta entre Funai e Secretaria do Meio Ambiente do Acre (Sema-AC) confirmou a presença dos Mashcos no Parque Estadual Chandless, atendendo a uma demanda antiga do órgão indigenista federal para a qualificação da informação na área protegida sob gestão do Governo do Estado do Acre.
Em 2017, entre junho e setembro, diferentes expedições da Funai identificaram a sua presença pelos altos rios Acre, Iaco e Chandless. Durante uma viagem ao alto Acre, a Frente de Proteção Etnoambiental Envira registrou vestígios na TI Cabeceira do Rio Acre, mais abaixo do seu curso, ultrapassando os limites da Estação Ecológica Rio Acre. Foram registrados, ainda, relatos sobre avistamentos incomuns de isolados, com fortes indícios de serem Mashcos, na TI Alto Purus. Em 2018, novos vestígios foram registrados nos altos rios Iaco e Purus.
Nos últimos anos, a Funai vem constatando que os Mashcos estão ocupando cada vez mais o território brasileiro. A população local e os técnicos do governo têm essa percepção, sobretudo após a constatação do grande número de evidências registradas em 2017. Outra mudança identificada foi o aumento na frequência das suas aparições durante o inverno amazônico, meses em que, tradicionalmente, ocupam as terras altas das cabeceiras. As comunidades vizinhas também observaram o interesse dos Mashcos em adquirirem instrumentos de metal e alimentos cultivados, o que não aconteceu em décadas passadas.
“UNASÓ!” NA BASE DO XINANE.
Em 1999, apareceu um grupo com cerca de 50 homens Mashco na praia em frente à Base do Xinane da Funai. Este acontecimento confirmou a presença de isolados Mashco no alto Envira, além de ter levantado questões sobre suas dinâmicas territoriais em um contexto de intensa exploração ilegal madeireira no lado peruano da fronteira. O incidente aconteceu no dia 26 de outubro e provocou a imediata evacuação da Base por parte da equipe que foi para a aldeia Sete Voltas do povo Ashaninka. Dias após o ocorrido, a partir dos vestígios, constatou-se que era um grupo bem maior, com aproximadamente 200 pessoas, entre homens, mulheres e crianças.Possíveis motivações para as mudanças
Possivelmente, essas alterações em suas rotas e períodos de deslocamento sejam motivadas pela busca de espaços mais seguros e em decorrência de conflitos com populações indígenas, ou não, com quem compartilham seus territórios.
Gestão compartilhada
A confirmação de grupos isolados em duas Unidades de Conservação do Acre (Estação Ecológica Rio Acre e Parque Estadual Chandless) amplia o debate sobre as estratégias de proteção territorial Mashco, exigindo a construção de processos de gestão compartilhada entre instituições governamentais federais e estaduais que monitoram as áreas de uso e ocupação dos isolados.
No alto Chandless, existem relatos de sua presença desde o início do século XX. Hoje, seus moradores mais antigos, descendentes de peruanos que ocuparam a região na época do caucho, contam histórias sobre encontros e lugares onde costumavam localizar seus vestígios. Também afirmam que os Mashco estão descendo cada vez mais e reocupando territórios que não frequentavam há mais de 20 anos.
Em setembro de 2006, foi criado o Parque Estadual Chandless (PEC). No seu Plano de Manejo, publicado em 2010, está a recomendação de “uma assessoria antropológica para o acompanhamento das atividades propostas e implementadas, garantindo a efetiva proteção dos territórios e dos recursos naturais utilizados tradicionalmente na área do Parque pelos grupos de índios isolados” (Acre, 2010).
Durante o planejamento do PEC, a área sul foi cogitada como “Zona Intangível”, para garantir o usufruto exclusivo e a proteção territorial dos isolados. Entretanto, em decorrência da falta de informações qualificadas, a mesma foi estabelecida como “Zona Primitiva”: “aquela onde ocorre pequena intervenção humana, com espécies de fauna e flora e fenômenos naturais de grande valor científico” (Acre, 2010). No Plano de Manejo, está indicado, ainda, que, após a comprovação da presença de isolados na área, o zoneamento do PEC deverá ser revisto, sendo indicada, em substituição da Zona Primitiva, a readequação da área para “Zona Intangível” (Acre, 2010).
Em 2014, a Funai e a Sema-AC elaboraram um projeto, amparados por um Acordo de Cooperação Técnica, para a criação e execução de um projeto para o Programa Áreas Protegidas da Amazônia do Ministério do Meio Ambiente. Entre as justificativas, estava a lacuna de informações sobre as formas de uso e ocupação dos Mashco na área, que dificultam o estabelecimento de diretrizes e estratégias para a sua proteção. As ações do projeto, que teve dois anos de duração, visavam estreitar a relação entre as duas instituições governamentais, os indígenas que residem no entorno (TIs Mamoadate e Alto Purus) e os moradores do PEC (2 famílias ribeirinhas), para minimizar conflitos relacionados ao uso dos recursos naturais e qualificar as informações em áreas com referências de deslocamento de grupos isolados.
Em 2015, foram realizadas oficinas com os moradores das duas TIs e da UC para investir e validar acordos de convivência entre indígenas, populações tradicionais e órgãos do governo. A parceria possibilitou experimentos no monitoramento da presença de isolados a partir da análise de focos de calor, imagens de satélite e informações prévias sobre os territórios de deslocamentos dos Mashco na fronteira Brasil-Peru. Observou-se a frequência, ou a reincidência, a partir de 2010, em algumas regiões do PEC. A primeira expedição de localização da Funai na área também aconteceu em 2015, resultando na confirmação da presença de isolados.
Em agosto de 2017, uma nova expedição da Funai e da Sema-AC, proposta no âmbito do projeto “Proteção e Monitoramento de Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato na Amazônia Brasileira”, da cooperação técnica entre CIT e Funai, foi realizada para qualificar informações de vestígios em um acampamento recente dos Mashco encontrado por um morador do Parque.
Assim, o fortalecimento de parcerias, acordos e entendimentos entre moradores do PEC, populações indígenas do entorno e instituições do governo federal e estadual é fundamental para o monitoramento da presença dos grupos isolados no PEC. Com suas dinâmicas próprias de uso e ocupação territorial, que ultrapassam fronteiras institucionais e nacionais, o modo de vida dos Mashco exige cada vez mais estratégias e ações integradas para a proteção dos seus direitos fundamentais.
Políticas transfronteiriças
Nas últimas duas décadas, comunidades e organizações indígenas brasileiras e peruanas vêm debatendo problemas e desafios comuns e pensando em conjunto a gestão e a proteção dos seus territórios. Em espaços de diálogo com a sociedade civil e órgãos governamentais, têm discutido sobre os impactos dos projetos de infraestrutura e das atividades extrativistas e ilícitas, bem como a necessidade de estratégias transfronteiriças que assegurem a integridade dos povos que desconhecem os limites nacionais.
Desde 2005, os Manchineri do Brasil e os Yine do Peru, povos vizinhos aos Mashco, estão intercambiando informações e construindo uma política de aliança para a proteção dos seus “parentes” isolados. Essa iniciativa é apoiada por organizações não governamentais de ambos os países. Para diminuir a pressão sobre o uso dos recursos naturais na área utilizada pelos Mashco, os moradores das aldeias da TI Mamoadate estabeleceram um acordo para que ninguém ultrapasse o igarapé Abismo, no alto Iaco, em território brasileiro.
As lideranças Manchineri e Yine também alertam aos governos sobre os possíveis impactos de um projeto de estrada que pretende conectar os municípios peruanos Iñapari e Puerto Esperanza, a dez quilômetros da fronteira com o Brasil, cortando ao meio o território Mashco. Discutem, ainda, sobre a importância do diálogo entre os dois países para a fiscalização das atividades ilícitas na fronteira, como o crescente narcotráfico.
Com base em 2014, os governos brasileiro e peruano assinaram um memorando de entendimento para a cooperação entre Funai e Ministério de Cultura do Peru, visando a promoção de atividades para a proteção dos povos isolados e de recente contato na fronteira Brasil-Peru. O acordo teve validade de dois anos e foi um primeiro passo para o diálogo entre as duas instituições indigenistas. Porém, sua efetivação dependia de um plano de trabalho conjunto, que não foi realizado. Uma série de situações de contato com grupos isolados em ambos os países exigiu ações emergenciais dos governos. As equipes reduzidas dos dois países, focadas em aplicar seus próprios planos de contingência, não encontraram as condições ideais para uma agenda integrada.
Assim, a cooperação entre Brasil e Peru – tanto para coibir atividades ilegais, quanto para reconhecer o papel das populações indígenas e tradicionais e suas organizações representativas na construção de políticas de proteção – é hoje fundamental para a garantia dos direitos dos povos isolados e de recente contato na Amazônia. A sobrevivência dos Mashco depende de políticas transfronteiriças construídas com a participação dos diferentes atores que trabalham em defesa dos seus territórios e modo de vida.